22.7.11

 

Referências Espinhosas



Algumas referências do artigo de JNogueira Pinto publicado no Semanário Sol de 15 de Julho de 2011 remetem-nos para os tristes casos de abandono a que Portugal sujeitou os africanos que honradamente se bateram ao lado das NT, na nossa derradeira guerra africana.


Se não fosse possível obter garantias de respeito da sua integridade física da parte dos antigos movimentos de guerrilha, seria imperioso dar-lhes a cidadania portuguesa e a garantia do seu recolhimento à velha Metrópole.


Menos do que isto seria - como foi - indignidade que ainda hoje não encontrou remissão.


Entretanto o tempo vai passando, escavando o remorso.


Quem pede a outrem o risco da própria vida para defender aquilo que entende serem os seus direitos deve assumir integralmente as consequências do sacrifício pedido.


Quem poderá ainda agir em nome de Portugal para tentar reparar este compromisso incumprido ?




AV_Lisboa, 22 de Julho de 2011


8.7.11

 

Maria José Nogueira Pinto : «Nada me faltará»





Com a devida vénia, transcrevo a seguir a última crónica de MJNogueira Pinto publicada no Diário de Notícias de 07 de Julho de 2011.

«Acho que descobri a política - como amor da cidade e do seu bem - em casa. Nasci numa família com convicções políticas, com sentido do amor e do serviço de Deus e da Pátria. O meu Avô, Eduardo Pinto da Cunha, adolescente, foi combatente monárquico e depois emigrado, com a família, por causa disso.


O meu Pai, Luís, era um patriota que adorava a África portuguesa e aí passava as férias a visitar os filiados do LAG. A minha Mãe, Maria José, lia-nos a mim e às minhas irmãs a Mensagem de Pessoa, quando eu tinha sete anos. A minha Tia e madrinha, a Tia Mimi, quando a guerra de África começou, ofereceu-se para acompanhar pelos sítios mais recônditos de Angola, em teco-tecos, os jornalistas estrangeiros. Aprendi, desde cedo, o dever de não ignorar o que via, ouvia e lia.


Aos dezassete anos, no primeiro ano da Faculdade, furei uma greve associativa. Fi-lo mais por rebeldia contra uma ordem imposta arbitrariamente (mesmo que alternativa) que por qualquer outra coisa. Foi por isso que conheci o Jaime e mudámos as nossas vidas, ficando sempre juntos. Fizemos desde então uma família, com os nossos filhos - o Eduardo, a Catarina, a Teresinha - e com os filhos deles. Há quase quarenta anos.


Procurei, procurámos, sempre viver de acordo com os princípios que tinham a ver com valores ditos tradicionais - Deus e a Pátria -, mas também com a justiça e com a solidariedade em que sempre acreditei e acredito. Tenho tentado deles dar testemunho na vida política e no serviço público. Sem transigências, sem abdicações, sem meter no bolso ideias e convicções.


Convicções que partem de uma fé profunda no amor de Cristo, que sempre nos diz - como repetiu João Paulo II - "não tenhais medo".


Graças a Deus nunca tive medo. Nem das fugas, nem dos exílios, nem da perseguição, nem da incerteza. Nem da vida, nem na morte.


Suportei as rodas baixas da fortuna, partilhei a humilhação da diáspora dos portugueses de África, conheci o exílio no Brasil e em Espanha. Aprendi a levar a pátria na sola dos sapatos.


Como no salmo, o Senhor foi sempre o meu pastor e por isso nada me faltou -mesmo quando faltava tudo.


Regressada a Portugal, concluí o meu curso e iniciei uma actividade profissional em que procurei sempre servir o Estado e a comunidade com lealdade e com coerência.


Gostei de trabalhar no serviço público, quer em funções de aconselhamento ou assessoria quer como responsável de grandes organizações. Procurei fazer o melhor pelas instituições e pelos que nelas trabalhavam, cuidando dos que por elas eram assistidos. Nunca critérios do sectarismo político moveram ou influenciaram os meus juízos na escolha de colaboradores ou na sua avaliação.


Combatendo ideias e políticas que considerei erradas ou nocivas para o bem comum, sempre respeitei, como pessoas, os seus defensores por convicção, os meus adversários.


A política activa, partidária, também foi importante para mim. Vivi--a com racionalidade, mas também com emoção e até com paixão. Tentei subordiná-la a valores e crenças superiores. E seguir regras éticas também nos meios. Fui deputada, líder parlamentar e vereadora por Lisboa pelo CDS-PP, e depois eleita por duas vezes deputada independente nas listas do PSD.


Também aqui servi o melhor que soube e pude. Bati-me por causas cívicas, umas vitoriosas, outras derrotadas, desde a defesa da unidade do país contra regionalismos centrífugos, até à defesa da vida e dos mais fracos entre os fracos.


Foi em nome deles e das causas em que acredito que, além do combate político directo na representação popular, intervim com regularidade na televisão, rádio, jornais, como aqui no DN.


Nas fraquezas e limites da condição humana, tentei travar esse bom combate de que fala o apóstolo Paulo. E guardei a Fé.


Tem sido bom viver estes tempos felizes e difíceis, porque uma vida boa não é uma boa vida. Estou agora num combate mais pessoal, contra um inimigo subtil, silencioso, traiçoeiro. Neste combate conto com a ciência dos homens e com a graça de Deus, Pai de nós todos, para não ter medo. E também com a família e com os amigos. Esperando o pior, mas confiando no melhor.


Seja qual for o desfecho, como o Senhor é meu pastor, nada me faltará.»

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Trata-se, sem dúvida, de um belo depoimento, compreensivelmente superior à concretização pessoal do seu conteúdo.


Mas isso é tão-só uma contingência do ser humano: raramente conseguir erguer-se à altura dos seus ideais, dos seus valores mais queridos e exaltados.


De qualquer forma, perdeu-se uma mulher decidida, denodada na luta por aquilo em que acreditava.


Desafortunadamente, no nosso hodierno acabrunhado Portugal, poucas restam de igual calibre.


Paz à sua alma e condolências à família enlutada.



AV_Lisboa, 07 de Julho de 2011

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